Conceptualização clínica, selecção de tratamento e abordagens transdiagnósticas | 4º Seminário SPPC | Apresentação
Quando, a partir dos Anos Oitenta do século XX, se começou a fazer investigação mais consistente sobre os resultados dos modelos psicoterapêuticos, gerou-se alguma celeuma entre clínicos e investigadores: vários estudos e meta-análises revelaram que, no que respeita à eficácia clínica, havia poucas diferenças entre os vários modelos terapêuticos, não existindo, assim, uma psicoterapia significativamente superior às outras. O veredicto do pássaro Dodo («Todos venceram e todos recebem o prémio»), apesar das críticas suscitadas, instilou a crise no seio dos mais importantes modelos terapêuticos, abrindo, assim, caminho a uma intensa revisão dos mesmos e ao movimento para a integração das psicoterapias.
Um dado, porém, parece indubitável: as Psicoterapias produzem resultados, funcionam, são, de um modo geral, eficazes. Mas são-no em virtude de que factores? Dos factores comuns? (isto é, a competência e empatia do Psicoterapeuta?; a proactividade e motivação do Cliente, qual «herói» da narrativa terapêutica?; a Relação Terapêutica como verdadeiro motor da eficácia clínica?). Ou em virtude das Técnicas Terapêuticas ou factores específicos? Ou pelo contrário, a eficácia das psicoterapias depende de tratamentos empiricamente validados que se traduzem, depois, em tratamentos manualizados?
Tanto o «paradoxo da equivalência» como os tratamentos empiricamente validados produziram alguma insatisfação e prepararam o terreno para a emergência de uma terceira perspectiva: a do Modelo de interacção entre Características do paciente e Tratamento, em que, como o próprio nome indica, a planificação do itinerário terapêutico é adaptado a determinadas características específicas dos clientes.
A esta complexidade, gostaríamos de acrescentar uma citação de Jonathan Raskin, psicoterapeuta construtivista, em “Metaphors amd Meaning: Constructing the Creative Psychotherapist “ (Journal of Constructivist Psychology, 12, 331-347, 1999):
George Kelly disse, certa vez, que as questões que colocamos são mais importantes do que as respostas que lhes damos. As questões que colocamos levam-nos a inventar determinadas construções do mundo. E é claro que a invenção é um processo criativo. Em psicoterapia, falamos, amiúde, da importância de os clientes inventarem novas e mais satisfatórias construções que os ajudem no seu dia a dia. De qualquer modo, também os psicoterapeutas, quando fazem terapia, têm que inventar um bocado. Ou seja, os psicoterapeutas têm que ser criativos (331).
Dito isto, podemos questionar-nos se e em que medida as perspectivas em foco neste seminário se integram no contexto metateórico e clínico que a Sociedade Portuguesa de Psicoterapias Construtivistas propõe como percurso de formação de psicoterapeutas. Seremos capazes deste equilíbrio dialéctico entre a necessidade de uma certa rigidez dos modelos atrás citados e a imperiosa criatividade promovida, e defendida, pelos construtivistas? Conciliar «Conceptualização clínica, selecção de tratamento e abordagens transdiagnósticas» com o ênfase construtivista na centralidade da criatividade em psicoterapia pareceu-nos um desafio ajustado à complexidade das práticas psicoterapêuticas.
O Prof. Paulo Machado, dado o seu percurso, é o interlocutor certo para nos acompanhar neste desafio. Psicoterapeuta e investigador há mais de duas décadas, viveu as transformações e evoluções dos modelos cognitivista-comportamentalista, acompanhou de perto e participou como autor no movimento construtivista, e tem actualmente responsabilidades relevantes no seio da comunidade internacional que promove a investigação e desenvolvimento dos modelos em causa neste seminário. Estamos certos de que esta é uma oportunidade para o início de uma relação de aprendizagem colectiva, rica em ensinamentos clinicamente relevantes. Formulamos sinceros votos de que daqui resultem posteriores encontros desta comunidade com o Prof. Paulo Machado a quem agradecemos o esforço e a generosidade de connosco partilhar o seu trabalho.
A Comissão Organizadora
Aníbal Henriques | José Serra | Cacilda Nordeste